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Reportagem

A maior tragédia da história do futebol

Sempre que se fala em tragédias na história do futebol, é quase uma unanimidade tratar o incidente de Hillsborough como o exemplo máximo. Midiaticamente falando, e pelos desdobramentos do caso nos anos posteriores na justiça, na sociedade inglesa e na cultura de futebol em geral, não há o que contestar a grandiosidade trágica daquele dia. Entretanto, numericamente falando, o que aconteceu em Lima, no Peru, em 24 de maio de 1964, é a partida de futebol que mais vitimou pessoas na história. Durante um jogo pelo pré-olímpico entre as seleções de Peru e Argentina, no Estádio Nacional de Lima, mais de 320 pessoas morreram após uma grande confusão.

O estádio estava lotado. 40 mil pessoas acompanhavam o embate. Após um primeiro tempo sem gols e sem anormalidades, a Argentina abriu o placar aos 15 minutos, com Manfredi, que aproveitou saída errada do goleiro peruano para marcar. Faltando dez minutos para o fim, o árbitro uruguaio Angel Pazos anulou um gol contra anotado pelo argentino Morales, gerando uma onda de revolta nas arquibancadas (e também em campo). Dois torcedores invadiram o gramado e foram brutalmente retirados de campo, deixando a torcida ainda mais irada.

Enquanto o juiz se refugiava, torcedores começaram a atirar objetos na direção da polícia, que reagiu fortemente com bombas de gás. Na tentativa de fugir da confusão, milhares de pessoas se depararam com as portas de saída fechadas, o que fez com que muitos dos que estavam ali fossem pisoteados até a morte. A tragédia também quase nos privou de uma das maiores estrelas do futebol do continente: Héctor Chumpitaz, capitão da seleção peruana em duas Copas do Mundo, estava em seu início de carreira, e quase desistiu do futebol depois de ser testemunha ocular do fato.

Enquanto centenas de pessoas morriam por asfixia, aqueles que conseguiam escapar iniciavam uma batalha fora do estádio com a polícia armada, que disparou incontáveis tiros contra a multidão. O número oficial de mortes é de 328 pessoas, porém, não inclui possíveis mortos por armas de fogo. Há relatos também de que dois policiais teriam sido mortos ainda dentro do estádio. Apenas duas pessoas sofreram sanções relativas ao incidente: Jorge Azambuja, comandante da polícia que ordenou que as bombas de gás fossem atiradas, foi sentenciado a 30 meses de prisão; e o juiz Benjamin Castaneda, responsável por cuidar do caso. Ele foi multado por entregar o relatório com seis meses de atraso e por não participar de todas as autópsias como deveria ter feito. De acordo com ele, os corpos estavam desaparecidos, e provavelmente foram enterrados como indigentes em Callao.

Curiosamente, um caso como esse possui pouquíssima documentação disponível na internet, o que faz com que pensamos que o que realmente aconteceu naquele dia, jamais seja trazido à tona.


Texto originalmente publicado no dia 7 de novembro de 2016, no blog Escrevendo Futebol.

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