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Roberto Cabañas, o mago do futebol paraguaio

Roberto Cabañas foi um dos jogadores mais talentosos do futebol paraguaio. Desbravou o futebol de diversos países em três continentes, e encantou a todos que o assistiram com belos gols, títulos e uma personalidade ímpar. Roberto Cabañas González nasceu em 11 de abril de 1961, em Pilar, uma pequenina cidadezinha à beira do rio Paraguai, distante 358 km da capital Asunción, e bem próxima à divisa com a Argentina. A cidade, inclusive, acompanhou Cabañas durante sua jornada como futebolista, tendo a alcunha de El Mago del Pilar. Era um jogador elástico, e se caracterizou também pelos gols acrobáticos, o que lhe rendeu um outro apelido, o de Mago de las Cabañuelas. Era também um jogador atlético. Tal como a lenda em torno das atividades físicas de Cristiano Ronaldo atualmente, diziam – e o próprio Cabañas fazia questão de confirmar – que o jogador realizava mil abdominais diárias.

E a magia do atacante começou no Cerro Porteño em 1978. Embora tenha atuado pelo time paraguaio por apenas três anos na equipe profissional, Cabañas marcou incríveis 36 gols em 40 partidas, mas não conquistou nenhum título. Fenômeno desde cedo, representou o Paraguai no Mundial sub-20 de 79. Logo na estreia, Cabañas marcou dois gols na vitória por 3 a 0 diante da Coreia do Sul e contribuiu para que a albirroja liderasse o grupo C. Outro jogador que brilhou no Mundial foi Romerito, que posteriormente viraria ídolo no futebol brasileiro. Nas quartas-de-final, porém, após um batalhado empate em 2 a 2 com a União Soviética, o Paraguai caiu nos pênaltis por 6 a 5. A URSS só pararia na final, diante da Argentina de Diego Maradona. 

Ainda em 79, passou a fazer parte da seleção principal. Romerito, ainda mais precoce, já era titular. Juntos fizeram parte da equipe que conquistou a Copa América contra o Chile. Cabañas jogou 20 minutos da segunda partida da final. Naturalmente, La Pantera chamou a atenção do exterior, mais precisamente do New York Cosmos. O então garoto atuaria ao lado de grandes estrelas do futebol. 

Todos imaginavam que seria apenas um coadjuvante de jogadores como Beckenbauer, Neeskens e Chinaglia, mas Cabañas se tornou um protagonista. Em cinco temporadas pela equipe estadunidense, foram 63 gols em 97 partidas, conquistando dois títulos da NASL (80 e 82). Seu auge no Cosmos aconteceu em 83, em que foi o artilheiro do campeonato com 25 gols, eleito MVP e ainda marcou aquele que se tornou o mais antológico gol marcado em sua carreira. A bola foi alçada na área, e em seguida escorada de cabeça para o meio. Cabañas está posicionado à frente da bola, e subitamente salta com os pés para trás dando um pequeno toque de calcanhar, fazendo um “chute do escorpião” anos antes do goleiro colombiano Higuita.

Em 85, retornou ao futebol sul-americano, dessa vez para o América de Cali. Pelos diabos vermelhos foi ídolo e um dos principais responsáveis pelos momentos mais incríveis e também mais dolorosos da história do clube. Por três anos seguidos (85, 86 e 87) levou o América para a decisão da Libertadores da América. Três duras derrotas para Argentinos Juniors, River Plate e Peñarol (a mais difícil de todas). Entretanto, está na história do América também com títulos, conquistando o bicampeonato nacional em 85 e 86, fechando o ciclo de cinco conquistas consecutivas do clube.

Nesse meio tempo, ajudou o Paraguai a se classificar para o Mundial de 86. O Paraguai não disputava a fase final desde 58. Na copa do Mundo do México, o Paraguai ficou na segunda posição do grupo B, em um grupo com os donos da casa, a Bélgica e o Iraque. Na terceira partida, Cabañas marcou os dois gols paraguaios no empate em 2 a 2 contra a Bélgica. Nas oitavas de finais, nada pode fazer diante da Inglaterra de Lineker, que venceu por 3 a 0. Em 87 disputou sua segunda Copa América.

Depois do tri-vice pelo América de Cali, partiu rumo ao futebol europeu para jogar pelo modesto Brest, rebaixado para a segunda divisão. Em uma época que a Ligue 2 era dividida em grupos, Cabañas foi artilheiro do grupo A da temporada 89/90 com 22 gols e recolocou o Brest na elite, sendo eleito o melhor jogador do campeonato. Na temporada seguinte seguiu tendo boas atuações e terminou o francês na honrosa 10ª posição. Com isso, foi contratado pelo Lyon, onde foi peça importante da equipe que ficou na quinta posição na Ligue 1, conquistando uma vaga para a Copa da UEFA. Porém, Cabañas não ficou para a temporada seguinte e retornou à América do Sul ainda em 91. Se o seu auge técnico havia passado, ao menos começaria uma das maiores idolatria do futebol argentino, sendo um dos expoentes em uma época de vacas magras do Boca Juniors.

Com a camisa xeneize caiu nas graças da torcida por seu temperamento e pelo especial “carinho” com o qual tratava o River Plate, maior rival. Talvez a derrota em 86 pelo América ainda doesse em Cabañas, e a responsabilidade de vestir a camisa do Boca tenha feito essa rivalidade aflorar ainda mais no delantero. Cabañas se destacava pelas frases que direcionava aos millionarios.

“River es grande en institución pero chico como equipo. No tiene jugadores de jerarquía. Boca Unidos le ganó a River con el nombre. Se asustan al escuchar Boca”

“No conozco a nadie de River, pero cualquiera que tenga esa camiseta es mi enemigo”

Participou de nove clássicos contra o River, ganhando cinco, empatando três e perdendo apenas um, com dois gols marcados. No total de seu período em La Bombonera, foram 67 partidas e 18 gols, segundo o Diário Olé. Conquistou o Apertura de 92 quebrando um jejum de títulos que perdurava desde 1981. Ainda foi campeão da primeira edição da Copa Master da Supercopa em final disputada contra o Cruzeiro.

Em 93 disputou sua terceira e última Copa América, marcando  também o último de seus 10 gols com a camisa albirroja, na vitória por 1 a 0 sobre o Chile, em Cuenca, no Equador. E foi neste país que Cabañas continuou sua carreira disputando um campeonato com o Barcelona de Guayaquil, provavelmente o último ano ainda em alto nível. Nos anos seguintes teve breve retorno ao Boca Juniors e ao Cerro Porteño. Passou pelo Libertad e se aposentou pelo colombiano Independiente Medellín.

Após três anos longe dos gramados, Cabañas voltou ao futebol no ano de 2000, para vestir a camisa do Real Cartagena. O atacante estava disputando um torneio de futebol de areia em Cartagena pelo América, no qual apareceu como artilheiro. O treinador do clube auriverde Hernán Herrera então o convidou, e motivado por poder mostrar seu futebol a seus filhos, decidiu retornar. Logo em sua estreia diante do Deportivo Pasto, marcou os dois gols do Real no empate em 2 a 2. Vale a nota: o goleiro René Higuita era companheiro de Cabañas no único time profissional de Cartagena. Seu último gol na carreira aconteceu de pênalti na vitória por 3 a 2 sobre o Tuluá. Foram três gols em nove partidas.

Após a aposentadoria – a definitiva – trabalhou na comissão técnica do América de Cali, chegando a ser efetivado como treinador em 2006, mas durou apenas doze partidas, com duas vitórias, seis empates e quatro derrotas. Mais recentemente, havia trabalhado como comentarista esportivo. No dia 9 de janeiro de 2017, aos 55 anos, um ataque cardíaco deu fim aos dias de magia de um dos paraguaios mais talentosos da história do futebol.


Texto originalmente publicado em 20 de janeiro de 2017 e atualizado em 9 de janeiro de 2018.

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